Somos uma espécie social. Os momentos de maior felicidade ou desapontamento dos seres humanos surgem da gratificação ou frustração relacionadas às necessidades de pertencimento social. Nossa motivação em manter relações sociais estáveis e significativas vem da nossa história evolutiva: esses vínculos garantiam caça, perpetuação da espécie, cuidados aos doentes, proteção contra predadores, entre outras coisas. A sobrevivência de nossos ancestrais dependeu tanto da rede social construída quanto da integridade física dos indivíduos. Se fôssemos solitários, não seríamos capazes de enfrentar os desafios do ambiente.
Um fenômeno chamado dor social ajuda a mensurar a importância das relações sociais. Referente ao sofrimento de quem é rejeitado por um grupo, sofre bullying ou perde um ente querido, a dor social provoca sentimentos e impactos no mesmo grau observado à experiência de uma dor física. Pesquisas recentes mostram que a dor social resulta da ativação de alguns componentes dos sistemas de dor física. Analisando em uma perspectiva evolutiva, entende-se que o sinal doloroso ancestral, que serve para limitar danos ao corpo, pode ter sido dirigido para alertar humanos e outros mamíferos sociais para a possibilidade de dano às suas relações sociais. Em outras palavras, assim como a dor física promove proteção corporal, já que sinaliza a presença de uma lesão e motiva uma atitude que interrompa o dano (como tirar rapidamente a mão de um objeto quente), a dor social pode representar uma espécie de proteção social, ao sinalizar um potencial afastamento da pessoa e sua rede de relacionamento e motivar a restauração dessas conexões e do pertencimento.
Nossa autoimagem e como gostaríamos de ser vistos interferem diretamente no modo como nos posicionamos socialmente. Pode-se deduzir que pessoas mais seguras de si e de suas habilidades teriam maior facilidade em galgar posições de maior destaque, enquanto as mais inseguras podem se esquivar ou mesmo rejeitar situações que lhes confiram maior visibilidade ou exigência. Hábeis ou não, todos desejamos pertencer, fazer parte de um grupo, ser aceito e enxergado com reconhecimento, independente da função ou papel social que desempenhamos.
Como já dissemos, a maneira como somos vistos – se somos ou não enxergados, aceitos e valorizados – contribui para o modo como constituímos a imagem que temos de nós mesmos. Alguns estudos já demonstraram, inclusive, que existem várias formas de agirmos para "concordar" com o que supomos ser o comportamento esperado, vigente, analisando o ambiente à nossa volta, ainda que em dissonância com a maneira como agiríamos sem a influência do contexto social. Frequentemente modulamos nossas ações com a intenção de tê-las validadas e aceitas por um grupo, especialmente aquele que nos seja relevante.
Assim como o psiquiatra John Bowlby, que desenvolveu a Teoria do Apego, e outros autores postularam a influência das relações significativas na construção de nossa autoestima, outras teorias têm buscado estabelecer a relação entre o ambiente social e o conceito que temos de nós mesmos. A teoria do “sociômetro” postula que a autoestima é importante para os indivíduos porque ela serve como uma medida do apelo social de cada um de nós. Especificamente, autoestima elevada estaria, segundo a teoria, associada ao fato do sujeito ser dotado de características como competência, virtude moral e atributos físicos que promoveriam sua aceitação pelas outras pessoas. Assim, a autoestima teria como único propósito funcionar como um sistema de monitoramento à reação dos outros a nós, o que faria com que ela flutuasse com o nível de aceitação percebido. A influência das relações sociais no modo como constituímos nossa autoestima é uma premissa antiga da psicologia. Uma meta-análise recente (2020) liderada pela pesquisadora Michelle Harris investigou os efeitos da autoestima nas relações sociais de 46.231 participantes, bem como os efeitos das relações sociais na autoestima de 21.995 participantes. Os resultados confirmam as hipóteses clássicas e contemporâneas de que as relações sociais e a autoestima se influenciam reciprocamente em todos os estágios do desenvolvimento humano. Observamos em nosso dia a dia diferentes manifestações dessa influência. Uma boa (e hilária) ilustração disso foi apresentada no programa Jimmy Kimmel Live em 2013, quando a equipe pediu a opinião de frequentadores do festival Coachella sobre bandas inventadas pela produção. Confira o resultado:
Exemplos como esse também nos põem em contato com um outro fenômeno atual que evidencia a íntima relação entre a maneira como nos vemos e como queremos ser vistos e as relações sociais que construímos. O fenômeno das redes sociais estabeleceu novas formas de nos relacionarmos, vermos e sermos vistos e percebidos pelo outro. Estudos atuais têm demonstrado que analisar as redes sociais de alguém pode predizer o risco de sintomas depressivos e como esse indivíduo tende a responder em situações de exclusão social. Nunca antes se experimentou níveis de exposição pessoal como hoje. Essa exposição de nossa imagem cumpre, como sempre, o papel de nos manter atentos ao que causamos nas outras pessoas. Sua aprovação é percebida por meio das ações do outro. E não basta a “visualização”, já que apenas os “likes” e compartilhamentos configuram a validação social. Vivemos a era em que o abastecimento de nossa autoimagem e autoestima se dá por meio dessa exposição e visibilidade. Nesse contexto, o olhar exigente do outro constrói o sentido de autoafirmação e contribui para modular o que percebemos sobre nós mesmos, ainda que a imagem tornada pública para avaliação seja apenas um recorte editado, “filtrado” e constantemente feliz de quem somos.